etapa IV: Santiago de Compostela
não sei por que explode o meu coração quando chego e te abraço. quase fico sem ar, quase desfaleço. não cabem em mim tanto amor e gratidão. sinto-me expandir nesse abraço e fico ali agarrada a ti a sentir-me em casa, a sentir-me plena, a sentir-me feliz. quem me dera não ter uma fila de turistas atrás de mim. é sempre assim, estanca a fila com a minha chegada. desculpem mas um amigo assim merece um abraço demorado. valha-me o chão da Praça de Obradoiro para, sem pressas, sem tempo contado e sem filas, nele me atirar, estender e deixar-me estar a mirar-te demoradamente por entre raios de luz e sombras. a perceber o que ali nos traz a todos.
e nisto me dou conta que, por mero acaso, ali chegara no dia 3 do mês de maio, dia da mãe, mês de Maria e do meu nascimento, e com a chuva a dar definitivamente tréguas. dou conta que, feitas as contas, ali não chegara apenas ao fim uma rota de quatro etapas a que se dá o nome de Caminho Inglês. ali terminava, na verdade, o Caminho que iniciara há três anos. é bem verdade quando dizem que o Caminho começa quando regressamos a casa. foi preciso ter duros regressos e voltar ao Caminho uma e outra vez. o peso da mochila de há três anos transformara-se em leveza, a dor dos pés em força, as perguntas em respostas, a necessidade de isolamento em maiores aprendizagens no contacto com o outro e em convívio, a estranheza e dureza do retorno ao quotidiano em sincera alegria.
às vezes desesperamos porque não escutamos as respostas. não vemos resultados. zangamo-nos. bastava lembrar-nos que a mais bonita flor já foi semente e não floresce num instante. mas temos sempre pressa e não nos lembramos. bastava observar a natureza, sermos pacientes… e entregarmo-nos.
agora sei que, neste Caminho, feito de forma tão espontânea e despretensiosa, chegara ao fim de um processo que há muito se iniciara. e agora sim podia regressar a casa. desta vez ia regressar a casa.