ontem a vida deu-lhe um enxerto de porrada. hoje um enxerto de porrada levou na aula de yoga. mas que se foda, que se foda tudo. se é raiva e revolta que há nela, que venha a raiva e revolta toda ao de cima. agarro-se ao chão, mete-se em posição e treinará até que não haja asana que a assuste. porque o que não a mata, torna-a mais forte. não importa que os braços lhe doam, que faltem as forças às pernas, que fique pisada e dorida. ela não é só luz, amor, anjo, compaixão como pensam que é. é também sombra, ódio, demónio, raiva. e não tem mal nenhum que caia, que chore, que grite, que diga foda-se. FO-DA-SE. está farta de ter de ser perfeita, menina bonita, toda sorrisos, toda bondade. farta de boquinhas – “hoje não estás bem”, “hoje não pareces tu”, “nem pareces que fazes tai chi”, “a meditação não te está a fazer efeito” – como se não tivesse direito a saturar-se e indispor-se, como se só se importassem com ela quando é sorrisos e abraços. deus e o diabo é que a guiam. será luz e sombra, amor e ódio, anjo e demónio, compaixão e raiva, abraço e espada. será tudo isso. e então afirma: “sou lila. eu Sou. e quero que tudo mais vá para o caralho.”